MB Review: Devilman, de Go Nagai
No início de 2018, a Netflix disponibilizou em seu catálogo uma nova versão animada do clássico mangá de Go Nagai, “Devilman Crybaby”. Dirigido pelo brilhante Masaaki Yuasa, o anime foi muito importante, pois trouxe a obra de volta à boca do povo.
Muitos amaram (como eu), outros ficaram chocados, alguns reclamaram do estilo de animação característico do diretor. Mas de um modo geral, a série foi muito bem recebida e é considerada por muitos como a melhor produção em anime feita pelo serviço de streaming.
Toda essa visibilidade, fez com que o mangá, que já era pedido para as editoras brasileiras por alguns leitores, fosse ainda mais requisitado, e em novembro de 2019, para a alegria de muitos, a editora NewPop lançou o volume 1 do mangá.
A obra
A publicação foi escrita e desenhada por Go Nagai e lançada na revista Weekly Shounen Magazine entre 1972 e 1973, rendendo um total de 5 volumes encadernados. Em paralelo com o mangá, um anime também era exibido na TV japonesa, entretanto, a trama da animação era muito mais leve, pois era majoritariamente voltada ao público infantil.
Na série televisiva, o Devilman possuía um visual um pouco diferente do mangá, além de atuar mais como um herói do que como um demônio propriamente dito. Tanto que na música de abertura do anime, chamada de “Devilman no Uta” (Canção do Devilman, em português), existe uma parte que chama o personagem de “herói da justiça”.
Já nos anos 80, Devilman recebeu alguns OVAs adaptando parte da história do mangá, dessa vez seguindo a atmosfera obscura do quadrinho, além de alguns outros spin-offs em anime e também em mangás. Mas isso é assunto para outra obra, até porque o universo de Devilman se expandiu muito com o passar dos anos, hoje iremos falar do mangá clássico.
Sinopse
“Akira Fudo era um estudante tímido que gostava de frequentar a biblioteca. Ele jamais poderia imaginar que a sua vida viraria de ponta-cabeça quando o seu melhor amigo, Ryo Asuka, o procurou para contar-lhe sobre a verdade do mundo. Que os demônios da antiguidade estão disfarçados entre humanos e planejam nos dizimar para reconquistar o controle do planeta Terra! A solução proposta por Ryo? Os dois amigos também se transformarão em demônios poderosos para salvarem a humanidade! Akira, depois de muita relutância, aceita a proposta de seu amigo e se funde ao poderoso demônio Amon – é o nascimento do lendário Devilman!”
As fusões em Devilman
Uma das coisas que eu acho mais legais no universo de Devilman é a forma que os demônios evoluem e se tornam mais fortes: eles se fundem, entre eles ou com animais/pessoas. E com essa fusão, além da mudança de aparência, transformando aquilo que já era bizarro em algo mais estranho ainda, a criatura também ganha novas habilidades.
Inclusive no mangá é dito que várias lendas contadas pelos humanos na verdade são demônios. Um exemplo usado é o vampiro, que é resultado de uma fusão entre um demônio e um morcego. É um elemento simples do universo da história, mas é legal pelas inúmeras possibilidades que isso traz ao universo. Por exemplo, Akira, é o escolhido para se fundir com um demônio chamado Amon por ser uma pessoa de coração puro e bondoso. Assim, mesmo após a fusão, o protagonista poderia se manter são, já que na grande maioria das vezes em que uma fusão do tipo ocorre a pessoa acaba perdendo totalmente sua humanidade e agindo apenas como um demônio.
Mesmo ele não se tornando um ser completamente demoníaco, é interessante ver como a feição do personagem muda e acaba ficando mais sombria, assim como as atitudes de Akira também vão ficando mais violentas em algumas situações, principalmente quando ele tem que lutar contra outros demônios, como a clássica luta do Devilman contra Sirene.
Os demônios e a humanidade
No início da obra, o mangá segue em um ritmo um pouco semelhante ao do anime. Diferente, mas com semelhanças, como alguns ataques meio toscos que Akira usa quando transformado. Conforme a história vai avançando, o quadrinho vai se distanciando cada vez mais da animação, ficando mais tenso e brutal.
A influência dos seres malignos nas pessoas também vai aumentando com o passar da trama. Vemos pessoas atacando as outras violentamente, massacres, e até mesmo a influência desses seres no surgimento de guerras e conflitos.
Mesmo que parte da culpa seja atribuída aos demônios, notem que eles não criaram nenhum novo método de causar discórdia entre as pessoas, e sim, usam de problemas pré-existentes para colocar o planeta em uma situação delicada, já que o objetivo deles é erradicar a raça humana. Um exemplo que gosto muito, é de quando eles se aproveitam da situação tensa entre Estados Unidos e União Soviética (que ainda existia quando o mangá foi publicado) para induzirem os líderes dos respectivos blocos a guerrearem.
A narrativa
Sem dúvidas, Devilman é um mangá que mostra o que há de pior em nós, seres humanos, e faz questão de exaltar isso, às vezes, até remetendo de certa forma ao apocalipse bíblico. Para acabar de vez com tais criaturas e com todo esse cenário caótico, Satã, o rei dos demônios, deve ser derrotado, e como sabemos, vai sobrar para o Akira segurar essa barra.
A segunda metade do mangá é, sem dúvidas, a mais marcante. Os acontecimentos vão escalando de tal maneira que deixa os leitores perplexos, dadas as proporções dos acontecimentos. A luta final, também é ótima, inclusive, no anime de 2018, essa luta ficou magnífica. Lembrem-se que, mesmo que Akira esteja fundido com Amon, ele ainda possui sentimentos, sentimentos esses que são conflitantes às vezes, e isso é importante para o desfecho da história.
Além de Akira, existem outros personagens interessantes, como o misterioso Ryo, que foi um dos responsáveis por toda a trama, e a Miki e sua família, que estão acolhendo temporariamente Akira em sua casa, também são peças-chave para o desenvolvimento do mangá.
O autor
Go Nagai é um autor das antigas, e o traço dele é bem característico da época, com personagens cartunescos. Eu já mencionei em outras resenhas, mas eu adoro esses traços mais antigos, porém sei que tem muita gente que acaba sentindo estranheza e sendo repelida. Para essas pessoas, eu digo: Não deixem que o traço impeça vocês de lerem uma obra prima como Devilman, e outra, o traço do Go Nagai é uma das maiores características dele. O fato do traço ser old school, não significa que ele é mal feito, muito pelo contrário, o autor às vezes desenha quadros com um nível de detalhes muito grande, e que causam impacto no leitor.
A edição nacional de Devilman
A edição da NewPop saiu pelo selo “NewPop Prime” e é maravilhosa. Ela compila os 5 volumes originais em dois, e possui capa dura, tamanho de 15×21 cm, papel Pólen Bold além de algumas páginas coloridas, ao preço de capa de R$94,90. A edição é bastante semelhante à versão americana, da editora Seven Seas, que é bem bonita, mas na minha opinião, a edição brasileira é ainda melhor.
A versão lançada no Brasil é baseada na edição bunkoban que saiu no Japão. O diferencial dessa edição é que alguns quadros do mangá foram redesenhados pelo próprio autor, já a edição americana possui todos os quadros e páginas exatamente como foram publicadas nos anos 70.
Vou colocar imagens abaixo para ilustrar essas diferenças. Um adendo muito legal é que ambas edições incluem os capítulos de “Shin Devilman”, uma história alternativa onde os personagens da obra vão resolver problemas envolvendo demônios em acontecimentos históricos. Tentaram introduzir esses capítulos de forma orgânica na história como se originalmente tivessem sido lançados durante a série original, mas não foram, o que é perceptível e quebra um pouco o ritmo da narrativa. Não chega a ser um ponto negativo, já que os contos são até legais.
A ilustração original (cima) e a do bunkoban (baixo).
Considerações finais
Em suma, ver Devilman publicado no Brasil foi uma das coisas que eu esperei por anos, e felizmente aconteceu. O mangá é um clássico absoluto que digo que deve ser lido por todos os fãs de mangás, principalmente se você é daqueles que fazem questão de ter grandes clássicos na coleção. O mangá traz vários assuntos que continuam atuais, mesmo que o traço entregue que é uma obra de quase 50 anos de idade.
Eu, com certeza, considero uma obra prima e dou uma nota 9,5 para o mangá. Recomendo também que assistam Devilman Crybaby, que fez algumas adições bem interessantes na história. No mais, fico na torcida para que a NewPop traga mais obras relacionadas ao universo de Devilman, como Devilman Grimoire, Devilman x Hades, Neo Devilman, entre outras. Devilman nunca é demais!
Agradecemos à loja parceira Anime Hunter por disponibilizar as edições nacionais para nossa análise.
Espero que tenham gostado dessa resenha. Nos vemos em breve!
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