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MB Review: Faculdade de Mangá

O quão mágico deve ter sido ter uma aula com o deus Osamu Tezuka? O criador de toda a estética que hoje conhecemos como mangá e autor de 700 histórias diferentes, sem eufemismo. Bom, um toque disso é o que podemos ver em Faculdade de Mangá, lançado pela editora NewPop em 2019.

Sinopse 

Em uma realidade pós-guerra mundial, a indústria de mangás começa a desabrochar, mas há poucas obras de suporte para as pessoas que gostariam de se tornar mangakás, além do pouco interesse das editoras em publicar esse tipo de material. Com isso em mente, Tezuka teve a ideia de misturar uma coletânea de histórias e tirinhas a pequenas aulas sobre o básico da indústria na época. Criando assim esta obra singular, recheada com a comédia e aventura típica do autor.

Narrativa

Faculdade de Mangá não tem exatamente uma história concreta, mas sim um conceito que é usado com maestria. Somos apresentados a um professor que está explicando a seus alunos como fazer mangás, falando um pouco sobre materiais e sobre narrativas. Essas explicações são entrecortadas com pequenas histórias em que o professor mostra na prática exemplos narrativos do que estava sendo dito ou então que, futuramente, vai pegar a história para falar de um ponto subsequente de sua aula.

Dentro da obra, temos algumas narrativas. Uma de faroeste com animais antropomorfizados, uma com inspiração no famoso conto “A Nova Roupa do Rei” e outra com um toque detetivesco sobre o assassinato de um gato. Em cada uma delas, são apontados os momentos em que algo deve ou não ser feito. Além disso, há uma breve explicação sobre os yonkomas, aquele formato característico de mangá de quatro quadros e, aqui para mim, enquanto estudante de roteiro e narrativa, foi a parte mais importante do mangá.

Enquanto vai explicando sobre a formação desse tipo de história, caracterizada por ser voltada principalmente para a comédia, o professor comenta sobre a construção narrativa principal dos mangás, que é utilizada até os dias de hoje. O chamado Kishotenketsu.

Kishotenketsu

Kishotenketsu é uma estrutura narrativa assim como Os Três Atos. A própria palavra mostra as divisões da estrutura. Ki, Sho, Ten, Ketsu.

Ki é a introdução, o momento em que a história precisa mostrar seu principal conflito. Sho é o desenvolvimento do conflito, algo vai acontecer e intensificá-lo. Ten é a reviravolta, o famoso plot twist que deixa a situação diferente, e Ketsu a conclusão da história.

Essa é uma estrutura muito conhecida e utilizada na literatura asiática e que, se você parar para pensar, diversos dos capítulos de seu mangá também a seguem. Não é a única, mas é algo importante e muito difundido lá. 

Como a ideia desta resenha não é aprofundar sobre essa estrutura, deixo aqui um vídeo no qual eu converso mais sobre, como um aprofundamento do assunto Kishotenketsu – Dicionário Narrativo. Recomendo também o livro Manga in Theory and Practice: The Craft of Creating Manga, de Hirohiko Araki.

E Osamu, mesmo sem palavras técnicas, acaba trabalhando e explicando como funciona essa estrutura narrativa, seguida de diversas histórias de página única exemplificando.

Como História, Vale a Pena?

Um ponto interessante a se observar é que, mesmo que essas histórias estejam ali apenas para ilustrar alguns pontos que o Professor levanta, as três pequenas histórias trabalham temas bem sérios como discriminação e até mesmo fake news, de uma forma leve, bem humorada e fantasiosa, mas ainda assim são pontos apontados.

Porém, as histórias se alongam tanto no decorrer do volume que você acaba se perguntando se era necessário que fossem deste tamanho, pois o que era pra ser discutido, já foi. E de uma forma que uma outra história, mais curta, resolveria a situação. 

E como manual de narrativa, vale?

Infelizmente, aqui vai uma questão relativamente negativa, nem por culpa da história em si mas da época. Os mangás cresceram e se adaptaram com o passar do tempo, então, dicas que foram passadas antigamente hoje em dia não tem mais tanta valia assim. 

Colocando em perspectiva, é como se estivéssemos em frente a um livro teórico de como escrever quadrinhos de herói e nos recomendassem enchê-los de texto. Hoje, os textos e diálogos se dinamizaram de forma que é tranquilamente possível páginas de silêncio ou de apenas duas ou três palavras.

Conclusão

Faculdade de Mangá se mostra como um panfleto, no melhor dos sentidos, para que as pessoas comecem a entender um pouco mais sobre mangás, mas aborda isso de uma forma básica e com conceitos que hoje em dia em sua maioria já não funcionam com a mesma intensidade. 

Ainda assim, é uma leitura ótima pelo seu valor histórico e suas histórias curtas já demonstram algumas preocupações do Deus dos Mangás em suas histórias. Para quem quer saber um pouco sobre a produção de mangás há um tempo atrás, pode ser uma boa, mas vão cientes de que, com os conhecimentos que são possíveis de se ter hoje, o que é abordado no mangá soa superficial.

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