MB Review: A Noite Além da Janela Triangular #2

O universo sobrenatural idealizado por Tomoko Yamashita continua no segundo volume de “A Noite Além da Janela Triangular”, com mais mistérios e novas interpretações sobre a trajetória dos personagens. Logo no início do segundo volume, é possível questionar alguns fatos sobre Erika Hiura, a complexa garota que parece estar envolvida em uma série de eventos macabros.

Mais uma vez, é importante alinhar expectativas em relação à obra. No volume 2, são apresentadas diferentes vivências e perspectivas sobre núcleo familiar. Mikado faz parte de uma família aparentemente regular, mas tem pânico de si mesmo e do que o cerca. Hiyakawa está totalmente deslocado socialmente e aparenta não ter uma família ou vínculos de amizade, despejando parte de sua obsessão em Mikado, e Erika, tão rejeitada quanto ignorada pela própria mãe, mas vulnerável, apesar de toda a sua força sobrenatural.

Essa narrativa está presente até mesmo em um caso que terá que ser solucionado pelos protagonistas, podendo marcar o início do desvendar de muitos acontecimentos passados e traumas pessoais dos personagens. Enquanto Hiyakawa parece um indivíduo cada vez mais assustador, toda a sua complexidade e profundidade ainda não foram reveladas, mas a construção dele é provavelmente uma das mais enigmáticas e completas.

Apesar de algumas obras não saberem equilibrar a forma como exploram passados conturbados e ações presentes questionáveis, a linha coerente de construção de personagens em “A Noite Além da Janela Triangular” aparenta ter sido um reflexo de muita análise, experiência narrativa e preocupação em criar personalidades que, durante todo o percurso, não param de fazer sentido e não se deslocam no mangá. 

Na obra, os elementos não são dispostos de forma casual, mesmo que a autora tenha explicitamente experienciado mudanças e questionamentos enquanto trabalhava no título, o que pode ter sido interpretado por determinados leitores como uma progressão em seus trabalhos. Isso causou impacto na forma como ela conduzia a história, mas sem perder a rica compatibilidade entre cada um dos capítulos. Seja evolução, maturidade, ou como for interpretado o impacto dessas mudanças: a obra continua sendo grandiosa dentro do que se propõe.

Além disso, são construídos cenários que, até o momento, fazem com que alguns leitores apontem a relação desbalanceada dos protagonistas. Hiyakawa propositalmente faz um contrato espiritual com Mikado, criando uma espécie de vínculo entre os dois, o que expõe Mikado aos atos de seu companheiro. Mikado é um personagem que sente uma forte curiosidade, ou mesmo atração, por pessoas com característicos poderes sobrenaturais, e sua alma é especialmente desprotegida e fácil de vasculhar, o que consequentemente faz com que essa atração seja mútua e profunda, despertando respostas em forma de ações obsessivas de Hiyakawa para mantê-lo exclusivamente ao seu lado.

A ambientação que sugere emoções predatórias, por vezes pode ser confundida com um interesse romântico, e talvez seja assim que alguns personagens se sintam em relação a Mikado. Em contrapartida, entre tantos questionamentos e demonstrações de novas camadas dos personagens, por um novo ângulo, o protagonista começa a evoluir em outros campos de sua vivência, iniciando um período de confronto aos seus medos.

Uma curiosidade interessante é que os leitores poderão notar um triângulo nas costas de Mikado. Além disso, seu nome pode ser lido como “triângulo” em japonês. A forma é e será muito explorada no decorrer da obra. O que será que podemos esperar das dicas inseridas por Tomoko em cada volume?

Por trás dos personagens – Erika

A autora Tomoko é frequentemente lembrada por sua forma habilidosa de construir personagens femininas marcantes e a Erika não é uma exceção. Mas não é restrita a isso, suas personagens são complexas e envolventes.

No volume em questão, a introdução da Erika intencionalmente sugere que ela desempenhará funções muito relevantes no decurso da trama. A composição de personagens femininas costuma ser um tópico discutido em diferentes demografias, onde diversas personagens não são desenvolvidas de uma forma em que o público consiga sentir alguma identificação significativa, e isso é subvertido com muita fluidez neste mangá. Mesmo que você não goste particularmente da Erika, sua presença é difícil de ignorar, sua força sobrenatural é inquestionável e sua existência nesse universo possui propósitos bem destacados, por mais que ainda não completamente desvendados.

Apesar disso, o leitor pode notar uma reviravolta sobre a personagem. Em algumas cenas, ela parece ansiosa e assustada, isso é destacado pela forma como suas sobrancelhas, olhos e braços são desenhados no momento. É reforçada a ideia de que, apesar das suas grandes habilidades, Erika ainda é uma garota adolescente que passa por medos terrivelmente humanos, por mais que esteja imersa em acontecimentos nada ordinários.

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