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MB Nacional: O Mundo de Yang, de Orlandeli

O Selo Graphic MSP, que surgiu em 2012, foi um dos maiores acertos do mercado de quadrinhos nacional, ao meu ver. Convidando diversos artistas para trabalhar em personagens conhecidos, além de dar uma nova visão e trazer histórias fantásticas, o projeto fez com que muitas pessoas conhecessem esses artistas e fossem atrás dos quadrinhos deles.

E lá estava eu, tendo acabado de comprar meu Chico Bento – Arvorada em uma CCXP, quando encontrei Sidney Gusman, o idealizador do selo. Pedi para que ele autografasse o exemplar e ele comentou em seguida “Chegou a pegar o autógrafo do Orlandeli? Ele tá ali naquela mesa” e me apontou uma das mesas do Artist Alley. Quem diria que isso faria com que eu conhecesse um dos, que agora considero, meus quadrinistas nacionais favoritos. E, apesar da introdução falando sobre a Graphic MSP, a resenha de hoje é sobre uma outra obra autoral de Orlandeli.. Sejam bem vindos ao Mundo de Yang.

O Mundo de Yang nasceu na internet, sendo publicado em um site próprio que hoje já não existe mais, chamado www.omundodeyang.com.br. O autor se aproveitou da postagem feita semanalmente e criou uma emulação do que é feito em tiras de jornal, gerando histórias autocontidas. Em outras palavras, se você ler qualquer uma das páginas desta fantástica história, terá a experiência do começo, meio e fim, mas, se ler de forma cronológica, verá a história como um todo e a experiência enquanto leitor será ainda mais gratificante.

“No momento, Yang está no meio de um confronto entre as energias do universo. Luz e Trevas! Equilíbrio é necessário. Quando algo rompe esse equilíbrio, tudo mundo. O mundo não é mais o mesmo. Yang é o único capaz de reverter isso. Mas ele ainda não sabe…” Assim inicia a história de Yang, um garoto que se vê transportado a um outro mundo e considerado, por algum motivo, como o responsável por trazer o equilíbrio àquele mundo. E se engana aquele que acredita que falei “por algum motivo” como forma de demérito. A realidade é que nem sequer as forças de convocaram o jovem sabem o porquê dele ter sido escolhido.

A partir desta premissa isekai, damos início a uma jornada que, apesar de brasileira, contém muita força oriental. Mesmo com bastante ação e muita comédia, a jornada também é filosófica, introspectiva e até autorreflexiva. Não são poucas as páginas que abordam ensinamentos ao pequeno Yang, lembrando inclusive os momentos de Mestre Oogway em Kung Fu Panda, em toda a sua forma de falar e abrir novos caminhos e novos pensamentos não só no protagonista, mas também em nós como leitores.

Apesar da história ter menos de 60 páginas, neste pequeno espaço de tempo somos apresentados a conceitos como a importância do mal e do medo; a necessidade de ambos existirem; o autocontrole emocional; o desprendimento do ego em prol de uma vitória futura e como um problema, visto e solucionado sob uma nova ótica, pode trazer resultados surpreendentes.

Mas a história não é apenas isso e seu brilhantismo se mostra em como Orlandeli consegue equilibrar todos esses ensinamentos em uma narrativa que, além de ter boas cenas de ação, contém ótimas doses de comédia, tendo uma piada por página praticamente. E tudo isso feito de uma forma que nenhum dos três pontos se torna maçante e repetitivo.

Falando da arte, Orlandeli tem um traço muito característico. É quase impossível olhar uma página desenhada por ele e não reconhecer, seja pelos olhos, pela quantidade de detalhes, pelas linhas feitas uma por cima da outra como se fosse um rascunho ou pela boca característica com o lábio superior fazendo um bico. Se estranhar a arte, vá mesmo assim. É um traço que casa com a proposta apresentada pelo autor, além de gerar um clima muito desconfortável quando se está abordando os conceitos relacionados ao medo e ao estranhamento, referente a algumas criaturas daquele novo mundo.

Sobre os personagens, neste primeiro volume temos 4 principais. Além de Yang, que é um garoto um tanto quanto arrogante e que gosta de zoar com os outros, temos A Voz (ou The Voice, o apelido que Yang carinhosamente dá a ele), um ser sem corpo que funciona com a consciência do menino. Mais para frente, somos apresentados a Loh, um lambari monge que se torna o mentor de Yang, além de constantemente soltar ditados e frases prontas filosóficas, que as enxerga como “pequenas pérolas que sintetizam anos de estudos na arte da guerra”. Por fim, temos o antagonista que vou deixar em aberto para não dar mais spoilers, mas já adianto que suas cenas são dignas de um quadrinho de terror, mesmo não sendo nada explícito.

A edição física deste primeiro volume conta com 68 páginas, em um formato quadrado de 19 x 19cm. Possui uma orelha enorme em sua capa que conta com um ótimo texto introdutório de Kazuo Nagamine, um amigo próximo do autor, além de uma ilustração da criatura com um verniz aplicado criando a sensação de estranhamento até de forma tátil. No fim do quadrinho, ainda conta com uma parte denominada “Yang por outras linhas”, que traz os artistas Antonio Eder, Davi Calil, Laudo Ferreira, Luciano Salles, Ruis Vargas, Spacca e Vitor Cafaggi fazendo ilustrações de suas versões de Yang. 

Para os interessados, podem comprar a história na loja do próprio autor [https://orlandeli.commercesuite.com.br/livros/o-mundo-de-yang] assim como suas continuações, Rumo ao Sul e Dois Cortes. Inclusive, nesta loja mesmo, há a opção de comprar o quadrinho com um chaveiro de um Moy Fah. Quem leu, entende a importância ciclópica deste artigo.

O Mundo de Yang consegue criar uma atmosfera e uma ambientação claramente inspiradas em culturas orientais. Sua filosofia apresentada faz com que, mesmo sendo um quadrinho com muita comédia e ação, nos faça refletir sobre a vida e sobre a importância de diversos aspectos do universo, inclusive os negativos. É uma ótima porta de entrada para fãs de mangás nos quadrinhos brasileiros.

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