MB Review: Dr. Stone vol. 1 – A ciência é 10000000% legal

Após um 2021 cheio de movimentos anti-científicos e a evidente necessidade de se depender da ciência para lidar com a pandemia, fui agraciado com a oportunidade de ler o Dr. Stone, um shounenzinho que está muito além da porradaria, buscando tornar a ciência um pouco mais cool do que as pessoas costumam tratar sobre o tema.

Dr. Stone é um mangá publicado na Weekly Shonen Jump, que começou a ser serializado em março de 2017 e soma até o momento 25 tankos. Também recebeu duas temporadas animadas pelo estúdio TMS Entertainment. No Brasil, o mangá é publicado pela Panini, atualmente na edição 22, e o anime está disponível na Crunchyroll. 

A edição segue o formato 13,7 x 20 cm, com miolo em offwhite, sem sobrecapa

A obra ganhou bastante atenção em seu começo pelo desenho de Boichi, e embora Riichiro Inagaki, responsável pelo roteiro, seja um nome forte e tenha bastante consistência em suas publicações, Boichi é um fenômeno por seu belo e imponente traço. Indo além dos seus criadores, a obra tem como força motriz a ciência e seu poder de mudança. 

 

Doctor Stone é uma obra que reneguei durante os seus primeiros anos de publicação, só abracei a oportunidade de conhecer após o anúncio da dublagem do anime, e admito que foi uma grande surpresa. Minha perspectiva sobre shounens sempre se voltou à diversão, e continuo seguindo essa lógica, com isso, não quero dizer que o roteiro precisa de ser qualquer coisa, apenas sinto que é uma demografia no qual posso me divertir, mas também pensar sobre o que está sendo dito naquela história. Dito isso, Doctor Stone não tem uma premissa genial, em seu primeiro volume somos situados sobre o mundo em que a obra irá se desenvolver, seus principais dilemas e alguns dos personagens que acompanhamos na obra, mas devo dizer que, embora a premissa seja simples, temos um diferencial na temática e objetivo da obra: vamos falar um pouquinho de ciência!

A história

Eu sou uma pessoa bastante vidrada em narrativas e ciência, e sempre que vejo uma obra conciliar bem esses dois elementos fico muito satisfeito. Em mangás/ animes isso não é tão comum, temos a figura do cientista em diversas obras, mas em pouquíssimas falamos de ciência propriamente dita, partir de um problema, coletar dados, testar hipóteses e posteriormente sua replicabilidade pode soar chato, ou pelo menos é um pensamento repetidamente colocado em palavras. 

E mesmo que isso possa ser refutado se pensarmos nas diversas histórias publicadas por Júlio Verne, ou mesmo Fundação do Isaac Asimov, uma obra monumental que trás a reconstrução da sociedade através da ciência e outros atores que estão adjacentes a ela. Percebeu algumas similaridades?! Desconstruir esse pensamento pode ser bem difícil, e em Doctor Stone temos uma tentativa, que até o momento considero bem sucedida, e mesmo que a review aqui exposta se resuma ao primeiro volume, já podemos sentir muito bem o que Doctor Stone representa e quais problemáticas guiam a história. 

Sinopse: Em um instante, todos os humanos do mundo viraram pedra. Este acontecimento misterioso envolveu o estudante Taiju e, depois de milhares de anos, ele e o seu amigo Senku despertam e decidem reconstruir a civilização do zero! E assim começa uma grande e única aventura de sobrevivência num mundo de ficção científica!

Dr. Stone se passa inicialmente em um mundo similar ao nosso, não temos a existência de poderes ou magias, mas tudo muda com um único evento. Em instantes, todas as pessoas do mundo se tornam estátuas de pedra, e aqui devemos perceber algumas pequenas dicas de que isso aconteceria, já que os primeiros eventos nos mostram os personagens Taiju e Yuzuriha encontrando passáros petrificados. Essas diversas dicas vão compor boa parte do plot de Dr. Stone, visto que o objetivo do protagonista é restabelecer toda a sociedade através da ciência, entender o fenômeno e seu surgimento, tal como a ciência tem feito com as diversas doenças e vírus que tem assolado a sociedade, o que se torna indispensável para a continuidade de um sociedade sem futuras reinfecções (Breve relação com o belo momento em que estamos inseridos).

Senku e Taiju são os primeiros humanos a conseguirem escapar da petrificação e acompanhamos inicialmente esse evento a partir de Taiju, mas vale destacar que após o evento da petrificação e posterior despertar dos primeiros humanos, percebemos que nosso verdadeiro protagonista é Senku Ishigami (Okay, não dá pra confundir depois de perceber o penteado zoado, mas no início somos conduzidos por Taiju). Sem trocadilhos deprimentes com o nome do garoto, é o primeiro a despertar, se mostrando um grande gênio, pelo que podemos entender inicialmente, os personagens mantém suas consciências enquanto petrificados, mas o Senku vai muito além, ele mantém sua consciência alerta contando o tempo que ficou petrificado.

Inicialmente a obra tem um tom bem interessante de aventura. Em seu primeiro volume, somos rapidamente adicionados nesse mundo selvagem, e exatamente por ser um mundo selvagem que Taiju e Senku não podem se preocupar com o fenômeno de petrificação em si, reconstruir a sociedade humana demanda refazer seus passos. Nesse ponto, mesmo Senku, representado como o homem da ciência, não poderia sobreviver muito tempo sem o auxílio da força. Um mundo selvagem demanda inteligência, mas também força física, e veremos a sobrevivência e desenvolvimento de diferentes ferramentas por Senku e Taiju nesse mundo. É interessante perceber que o laço entre os dois personagens é de extrema confiança, essa relação entre ambos pode ser pensada no sentido de desenvolvimento de personagem, mas também, da importância de se relacionar a ciência como os diferentes elementos que compõem o mundo em que vivemos.

A ciência não escolhe quem salvar

Com o desenrolar do primeiro volume, compreendemos que a explicação pro despertar de Taiju e Senku não se baseia meramente em força de vontade ou qualquer elemento fantasioso, temos a química figurando, e devo dizer que é absolutamente bizarro a diversidade de conhecimentos de Senku, longe de ser um problema, o poder da narrativa é de quebrar e torcer a realidade que conhecemos, e inicialmente, o elemento mais fantasioso da obra é o próprio Senku, esse conhecimento absurdo e o seu esforço para mudar o mundo através da ciência acabam dimensionando muito bem a obra como um shounen, é bem divertido perceber a tentativa e erro por trás de cada ferramenta que criam, e nesse sentido, o líquido ressuscitador é a primeira grande invenção apresentada na obra, sua base é ácido nítrico e álcool, produzindo um forte solvente capaz de desfazer a petrificação, e antes que digam que é particularmente aleatório, creio que a proposta seja essa mesmo, a descoberta não é sempre consciente, e esse princípio foi muito bem empregado aqui.

A descoberta acaba coincidindo com a necessidade de usar o líquido de petrificação em uma situação de emergência, como efeito de necessidade, Tsukasa Shishio “O mais forte primata do ensino médio” é despetrificado, resolvendo a situação, mas sendo uma incógnita sobre suas futuras ações, embora inicialmente os 3 personagens se relacionam bem, suas visões entram em confronto a partir do momento que Tsukasa começa a destruir as petrificações de pessoas mais velhas, motivado por sua crença de que apenas as novas gerações podem ser despertadas, o que obviamente vão de encontro com a visão de Senku e Taiju, que vai muito além da ideia de que ambos são personagens nobres e desejam salvar todos por salvar, talvez Taiju represente essa generosidade, mas Senku representa muito bem a imparcialidade científica, lembrando que dentro da perspectiva científica, a ciência não tem ideologia, seu objetivo é sempre resolver problemas, e embora no mundo real isso seja expressamente impossível, talvez não seja nem o ideal, aqui temos diversos pressupostos da ciência sendo utilizados em toda a narrativa.

Por fim, temos a despetrificação da Yuzuriha, que embora não tenha citado anteriormente, e parte disso porque conhecemos muito pouco da personagem nesse primeiro volume, é a garota que Taiju ama, e literalmente passa seus 3000 anos de petrificação resistindo a perda de consciência apenas pra se declarar para ela, obviamente se declarar não é uma prioridade, visto que o confronto com Tsukasa passa a se tornar um confronto direto, mas no desenrolar das próximas edições teremos mais da personagem. Finalizamos este primeiro volume com o nosso trio de personagens, Senku, Taiju e  Yuzuriha, saindo em uma jornada atrás de pólvora, única forma de lidar com Tsukasa.

Vale a Pena??

Dr. Stone é um mangá muito bem desenhado e com uma premissa bem apresentada em seu primeiro volume, sua força está nos personagens e na ideia central de apresentar o valor e as bases da ciência, mesclando muito bem com os elementos que definem um bom shounen. A edição é muito competente, sendo umas das mais básicas da Panini, o papel possibilita o aproveitamento da arte do mangá, a tradução e revisão estão muito bem feitas, emulando muito bem os sentimentos e a comédia que caracterizam a obra.

 Por fim, é uma história muito divertida e consistente com sua proposta, satisfazendo a gregos e troianos, seja com seu humor e tensão, ou o equilíbrio entre batalhas intelectuais e físicas, mesmo que nesse primeiro momento a batalha seja contra a natureza, e seu poder de continuar se transformando, independemente da sociedade humana. 

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