MB Literário: Lu over the Wall

Apesar da capa não ter me chamado atenção de forma alguma, ao ver que a história original é de Masaaki Yuasa tive uma certa empolgação para ler Lu Over the Wall. Yuasa é um diretor de animações conhecido por seu estilo único. Devilman Crybaby, Ping Pong – The Animation e Keep your hands off Eizouken são alguns de seus trabalhos e aqueles que já assistiram qualquer um dos três acima citados sabem o quão característico é o estilo de contar histórias deste diretor. Então, após ler a novelização do filme criado por ele, vamos a resenha.

Sinopse Oficial

Aviso: Antes, vale a pena comentar que essa sinopse não se importa em dar spoilers. Mais da metade do livro está descrito nela.

Kai vive numa cidadezinha pesqueira com seu pai e seu avô supersticioso que sempre o alertava dos perigos da água e seus habitantes sereias. Por causa disso, sua família não trabalha mais no mar, nem sabem nadar, e são conhecidos como pescadores da terra. Um dia, desafiando as ordens do velho, Kai sai de barco com amigos da banda e acabam testemunhando atividade ilegais e sendo confrontados pelos criminosos. Nesse momento, surge Lu, uma sereia amigável e animada que afugenta os homens e ajuda os garotos. Logo Lu se une à banda, mas seus dias de paz e diversão são ameaçados quando ela é descoberta!

Trama

A história de Lu Over the Wall segue um padrão que já vimos diversas vezes. Kai é um garoto tímido e introvertido, características que são reforçadas pela sua convivência com sua família, vivendo em um lugar costeiro sem saber nadar, devido aos traumas que seu avô carrega. Traumas estes tão intensos que fizeram com que o senhor obrigue seu filho e seu neto a evitar o mar a todo custo.

Isso gerou uma fama para a família de “pescadores de terra firme”, sendo praticamente os únicos da região que não trabalhavam diretamente com o mar. O que, mais uma vez, é um fator que colabora com a inibição social de Kai, cujo único hobbie é divertir-se anonimamente no computador, criando músicas e postando na internet, o que lhe deu certa fama. Mas, por um descuido, duas pessoas de sua sala perceberam quem ele era e pediram para criar uma banda.

Então, na volta de um ensaio, Kai se envolve em uma briga e acaba sendo salvo por uma sereia que se apresenta como Lu. A partir daí, a história começa a se desenvolver com essa amizade única, com Kai querendo proteger Lu, enquanto a sereia tenta conhecer o mundo.

Saindo um pouco da narração de eventos e partindo para a parte crítica, a história como um todo é bem escrita. O ritmo é algo condizente com a trama e as conversas entre os personagens principais são coisas que você aceita que seriam ditas por crianças. Dito isso, a incoerência que a trama tem para consigo mesma é um grande defeito do livro.

São alguns os pontos nos quais isso fica visível, e destacarei o principal deles. A partir de um determinado momento, Kai, o protagonista, se torna bem mais extrovertido, brincalhão e sorridente. E essa transformação não é feita de forma gradual ou natural, mas sim de uma hora para outra. O personagem praticamente dorme com seu isolamento social cotidiano e acorda com um animo de dar inveja. Tal transformação pode ter sido uma alteração emocional causada pela sereia, mas não há pistas referentes a isso então não é possível afirmar.

Há ainda outras inconsistências ou questões que fazem com que pensemos “Não seria assim que uma pessoa se comportaria”, como Teruo começando uma discussão de pai para filho com Kai, apenas para agir como um adolescente de anime logo em seguida por ficar envergonhado; ou uma outra cena na qual fica subentendido que Lu fez respiração boca-a-boca em Kai para salvá-lo de um afogamento sendo que a sereia dez páginas atrás nem sequer sabia o que era um beijo.

A autenticidade de cada mídia

Esse livro acaba sendo um exemplo muito bom de que, mesmo que uma história seja boa em uma determinada mídia, não significa que transpô-la para outra a trará com a mesma força. A trama em si importa muito menos do que a forma com a qual ela é contada.

Em diversas entrevistas, o escritor Alan Moore comenta sobre como Hollywood adapta histórias que foram pensadas com a linguagem de livros ou de quadrinhos para os filmes e com isso acaba-se perdendo muito do original. Claro, por ser Alan Moore, isso foi dito de uma forma mais… ríspida, mas o cerne da questão levantada por ele é esse: Quando se adapta algo para outro formato, se pensa muito mais no dinheiro que será conseguido com a adaptação do que com a necessidade dessa adaptação. 

Da mesma forma com que muitos filmes e séries não precisam de sequência e só ganham porque o dinheiro fala mais alto, muitas obras são adaptadas para outras mídias pensando primariamente no retorno financeiro. E isso não é uma crítica aos criadores, seja os diretores dos filmes da Marvel e da DC ou até mesmo o autor desse livro, Senya Mihagi. Tenho certeza que, dentro do possível, todos eles fizeram algo para que transmitisse ideias ou sensações ou até buscar a fidelidade.

Mas nem toda história precisa disso. Lu Over the Wall pode ser um ótimo exemplo. Não vi o filme porque acredito que tornaria minha resenha enviesada e uma obra tem que se bastar por ela mesma aqui, mas ao ver alguns designs de personagens e algumas cenas, pude perceber que existem algumas coisas que funcionam melhor com toda a questão da animação dirigida por Yuasa, como o próprio design de personagem de Lu, que ao mesmo tempo que parece fofa, dá um ar de bizarrice. A capa, única ilustração da versão física, dá um ar bem mais infantilizado a toda a trama que acaba não casando tão bem com a obra como o jeito único que o filme aparentemente proporciona.

Edição Nacional

Não escondo de forma alguma que as edições da NewPop no geral não me agradam devido a sua revisão de texto, na qual erros de ortografia constantes e faltas de cuidado editorial tem se tornado a regra, não a exceção. Porém, fico contente em dizer que talvez esta tenha sido a melhor edição da editora que eu já vi. Com 272 páginas no papel pólen soft, o livro tem o tamanho de 12,8 x 18,2 cm ao preço de R$29,90. O livro não apresenta nenhum paratexto, porém acredito que não fazia parte da proposta, então essa exclusão é condizente.

Começamos com o título, um índice, um breve prólogo de menos de uma página e já vamos direto a história. Ao todo, temos 5 capítulos e um epílogo, cada um deles sendo bem separado. A diagramação das páginas é boa e confortável de se ler e por diversas vezes, há notas de rodapé explicando questões que os leitores poderiam não entender devido a barreiras linguísticas e culturais. São poucas, mas muito eficientes e justamente uma das questões as quais reclamei da falta na resenha de Fireworks. E em minha leitura, encontrei apenas dois erros de português, mas nenhum deles tão gritantes ou que atrapalhem a experiência de forma significativa.

Conclusão

Lu Over the Wall é um livro mediano. Não me agradou muito na leitura, mas também não me desagradou no geral, exceto por algumas incoerências que afastam a leitura. Apesar de um excelente trabalho gráfico da NewPop, sugiro ir para o filme caso queira conhecer a história. 

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