MB Review: Gangsta

Em Junho de 2011, uma autora iniciou seu trabalho na Monthly Comic @ Bunch. Contando a vida de 2 faz-tudo trabalhando em uma cidade corrupta, mexendo com policiais, máfias e um toque quase sobrenatural. Infelizmente, a história se mantém inacabada até os dias de hoje, pois no meio de sua serialização, a autora foi diagnosticada com lúpus eritematoso sistêmico. Mas, enquanto torcemos pela recuperação da autora, temos 7 volumes de sua obra para discutir. E aí? A jornada vale por si só ou precisa da finalização?

Sinopse Oficial

Worick e Nicolas são uma dupla disposta a dar uma mãozinha ao submundo de Ergastulm, uma cidade dominada pela máfia, repleta de crime, drogas e prostituição. Mas os dois têm seu preço, e seus segredos! “Alô? Obrigado por ligar para os faz-tudo. Em que posso ajudar?”

Narrativa

Como descrito na sinopse, a história de Gangsta se mostra simples no início. Worick Arcangelo e Nicolas Brown são dois faz-tudo no submundo de uma cidade corrupta. Com trabalhos de “queima de arquivos” até a venda de seus próprios corpos em bordéis, a dupla ganha a vida como consegue, sem se aliar diretamente a nenhuma das grandes máfias que controlam Ergastulm.

Porém, com o passar dos volumes, a narrativa se expande e vai mostrando cada vez mais camadas da história e criando um mundo chamativo e que pode ter muito a dizer. O que se inicia como uma história slice of life de duas pessoas regada a violência, vai se aprofundando nos personagens, suas relações e as relações que estes têm com os demais.

Apesar do protagonismo ser de Worick e Nick, não dá pra esquecer de Alex, uma prostituta que teve sua vida salva no primeiro capítulo pelos faz-tudo e passa a trabalhar com eles para recompensá-los. Sua história, apesar de ainda não ter sido tão profundamente explorada quanto os outros dois, cativa e faz com que mostre a crueldade do mundo e é uma ótima alusão ao TEPT, Transtorno de estresse pós-traumático, com uma abstinência de um remédio específico.

Boa parte do mundo e da trama, inclusive, tem correlações com remédios. Seja por questões de drogas ou por uma espécie de pílula feita neste mundo chamada Célebre, que foi criada em um contexto de guerra para criar super humanos, mas acabou gerando um vício gigantesco devido à overdose causada. As consequências desta droga foram tão intensas que algumas pessoas passaram tais problemas para a próxima geração e, por isso, filhos destas pessoas não vivem muito. Pela baixa expectativa de vida, foram apelidadas de “Crianças do Crepúsculo”, ou só Twilights (Crepúsculo, em inglês). Nick é uma delas.

Os Twilights são tratados como meros capachos, abaixo dos seres humanos. Um preconceito forte e enraizado a ponto de existirem caçadores de extermínio de Twilights, além de passeatas a favor de um Apartheid entre “os seres humanos normais e os Twilights”. Como “raça inferior”, eles andam pelas ruas com uma dog tag, aquela plaqueta de identificação militar, com seu nome, informações de onde veio e sua força. Com este pano de fundo, podemos ver, com o passar dos volumes, os traumas e problemas de Nick, e continuamos acompanhando a vida de faz-tudo enquanto eles se afundam cada vez mais na lama em questões envolvendo as grandes máfias da cidade.

Mas o ponto forte do mangá também é seu ponto fraco. Se as relações entre personagens e o desenvolvimento deles chamam a atenção, é necessário uma atenção maior do que o de costume para não se perder em quais personagens são relacionados a quais famílias; quais personagens se gostam; quais se detestam; quais têm relações de parentesco, e assim por diante. Não é uma miríade de personagens, mas é necessária uma atenção maior quanto a isso, ainda mais com personagens que são visualmente parecidos.

Falando do visual, a arte é linda. Traz uma sensação urbana e negativa, mas não ao nível de Dorohedoro, o que é uma coisa boa, visto que são propostas diferentes. As cenas de ação são limpas, mostrando de uma forma direta e fácil de entender o que está ocorrendo e as problemáticas de forma sutil, como uma possível overdose de Celebre. Existem vários momentos de comédia, principalmente por conta de Worick e Alex, mas são bem subjetivos. Pode ser que agrade quem lê mais do que me agradou. 

A edição nacional da JBC foi lançada de 2015 a 2016, compilando os sete primeiros volumes. O oitavo não chegou a vir para o Brasil, pois a autora só conseguiu lançá-lo em 2018, devido a questão da doença que comentamos no início, e logo em seguida entrou em hiato novamente. Em termos de autoria, eu torço muito para que ela se recupere, demorando o tempo que for necessário, mesmo que nunca mais volte a publicar, e entendo o porquê a editora não teve interesse em trazer esse último volume lançado 2 anos depois do fim da publicação, ainda mais após o início da politica de lançamento em blocos, entretanto devo deixar avisado que o volume 7 finaliza em um gancho que deixa os leitores mais atônitos que o meme do Pikachu.

Além disso, um ponto que eu pessoalmente não gostei em alguns momentos foi a escolha de manter alguns termos em inglês. Como exemplo, destaco uma cena em que vão comentar sobre os quatro maiores chefes da máfia local e se referem como The Four Godfathers, ao invés de colocarem Os Quatro Poderosos Chefões, visto que é uma clara referência ao filme de ‘72 de Francis Ford Coppola, baseado no livro de mesmo nome de Mario Puzo. Outros termos foram mantidos com os nomes em inglês ou em outros idiomas, o que pode confundir ainda mais as pessoas que forem ler e precisar manter as informações de pessoas que citei três parágrafos atrás.

Realista e visceral, Gangsta é para os fãs de uma máfia do submundo. Com foco em seus personagens, a obra de Kohske consegue cativar e mostrar um mundo alternativo, mas que infelizmente, possui várias semelhanças com o nosso.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *